Instagram: A Nova Seita Digital?
Greta Lopes
Fundadora e CEO da Casa Offline, mestre em Artes Cênicas pela UNESP
19.ago.2024 às 10h00
Instagram: A Nova Seita Digital?
No mundo hiperconectado de hoje, o Instagram não é apenas uma plataforma de compartilhamento de fotos; ele se tornou um espaço onde ideologias de vida e padrões sociais são não só divulgados, mas amplamente seguidos. Essa adesão quase cega a valores promovidos por influenciadores digitais e a constante busca por validação online levantam uma questão provocadora: poderia o Instagram funcionar como uma espécie de seita moderna?
Para entender essa correlação, é fundamental analisar como seitas tradicionais operam. Seitas costumam ser lideradas por uma figura carismática que exerce controle significativo sobre os membros, oferecendo doutrinas exclusivas e promovendo isolamento social. Embora o Instagram não tenha um líder único, ele é um espaço onde influenciadores digitais—verdadeiros líderes de opinião para milhões de seguidores—desempenham um papel semelhante. De acordo com uma pesquisa de 2021 da Morning Consult, 72% da Geração Z e 63% dos Millennials seguem influenciadores digitais. Esses números ilustram o poder que esses líderes têm para moldar comportamentos e crenças, semelhante ao papel dos líderes carismáticos em seitas tradicionais.
Outro aspecto preocupante é o impacto do Instagram na saúde mental e no isolamento social. Um estudo da Royal Society for Public Health do Reino Unido, publicado em 2017, classificou o Instagram como a pior rede social em termos de efeitos na saúde mental dos jovens. A plataforma, ao promover uma cultura de comparação constante e a busca por uma imagem perfeita, leva muitos usuários a sentirem-se inadequados, isolados e até mesmo deprimidos. Esse isolamento pode ser comparado ao isolamento social promovido por muitas seitas, onde a conexão com o mundo externo é desencorajada em favor de uma dedicação exclusiva ao grupo.
O Instagram também impõe, de maneira sutil, uma espécie de “doutrina” digital. A busca incessante por curtidas, comentários e seguidores transforma o comportamento dos usuários em uma prática ritualizada. Assim como em uma seita, onde os rituais e práticas exclusivas são centrais, os usuários do Instagram seguem padrões de comportamento que muitas vezes não são questionados, mas aceitos como normais ou desejáveis.
O controle e a manipulação são outros elementos presentes tanto em seitas quanto na operação do Instagram. Os algoritmos da plataforma são projetados para maximizar o engajamento, o que muitas vezes leva os usuários a se comportarem de maneiras que garantam maior visibilidade e aprovação social. Esse comportamento induzido por algoritmos lembra a forma como seitas manipulam psicologicamente seus membros, encorajando a conformidade e a dependência.
Por fim, a repressão de dúvidas e questionamentos também é uma característica compartilhada. No contexto das seitas, questionar a liderança ou as doutrinas é frequentemente desencorajado. No Instagram, críticas à cultura da plataforma, como as discussões sobre seus impactos negativos na saúde mental, muitas vezes são minimizadas, enquanto a narrativa dominante continua a promover uma visão superficialmente positiva.
Concluindo, a correlação entre o funcionamento de uma seita e o modo de operação do Instagram é inquietante. Embora o Instagram não seja uma seita no sentido estrito, a dinâmica de poder, controle, e conformidade presentes na plataforma sugere que as tecnologias contemporâneas podem, sim, replicar padrões de comportamento semelhantes aos de seitas. Em uma sociedade cada vez mais dependente da tecnologia, é crucial refletirmos sobre o impacto dessas plataformas em nossas vidas e nossa liberdade de pensamento. Afinal, o que diferencia uma comunidade conectada de uma seita digital pode ser, muitas vezes, apenas uma linha tênue.