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proposta de encenação

PROPOSTA DE ENCENAÇÃO
por Greta Lopes

Qual será a linguagem teatral que podemos construir para disputar o imaginário cooptado pela velocidade das mídias sociais? Vídeos curtos. Reels. Shorts. Dopamina ou linguagem? Quais as estratégias cênicas que criaremos para conseguir captar o olhar do espectador? O desafio do teatro contemporâneo é fazer com que o público não pegue no celular por alguns minutos? É teatro ou conteúdo?


Uma companhia de teatro chega na Praça Elis Regina no Butantã. Corpos em vida, em atitude carnavalesca. É uma trupe ou um bloco de carnaval? Artistas com seus instrumentos musicais e seus objetos cênicos se estabelecem em uma praça pública para denunciar o assombro das forças corporativas das big techs.


Faremos isso por meio da linguagem carnavalesca apreendida pelo Bloco Vai Dá Boa. Os ensaios aos domingos ao longo dos anos nos aproximou das pessoas reais da Praça Elis Regina. Geralda da Feira. Jáfia do Samba. Marta do Bar Cantinho da Vila. Sorriso da Subprefeitura. Nelson da Casa de Cultura. Wilson professor da EMEF. Luiza nossa mirim do tamborim. Pessoas e corpos que aos poucos foram compondo uma linguagem. Nosso teatro de rua terá portanto o mesmo trajeto de criação: ensaios na praça, treinamentos na rua, linguagem feita aos olhos do espectador. Erros e acertos assistidos. Nossa linguagem sendo feita o tempo inteiro no fluxo da praça e da vida.


Será que encontraremos Ágatha no corpo de alguma vizinha sentada no banco da praça com os olhos fixos no celular? Se Ágatha já existe, nosso papel será o de retirar um véu espesso sob os olhos do público e revelar uma crítica ácida e bem humorada aos gigantes da tecnologia. Sabemos que também somos usuárias assíduas das ferramentas, mas também sabemos fazer uma crítica sobre o poder excessivo que elas têm em nossas decisões mais íntimas e públicas.


O jogo teatral será fundamental para a construção de uma linguagem cômica, veloz e viva. Temos um modo de representação vinculada aos ensinamentos do francês Jacque Lecoq, que desenvolveu uma pedagogia de interpretação por meio das máscaras, pesquisa descrita em seu livro “O corpo poético: uma pedagogia da criação teatral”. Os treinamentos formativos da Cia Vai Dá Boa permearão a mesma dimensão de Lecoq, que introduziu o conceito de mimodinâmica, uma exploração da relação entre o movimento e a emoção. Ele ensinava as atrizes como diferentes qualidades de movimento (leveza, peso, fluidez, resistência) podem transmitir diferentes estados emocionais. Além disso, Lecoq também fazia as alunas estudarem arquétipos e elementos naturais (como água, terra, fogo e ar) para entenderem como esses elementos podem influenciar o movimento e a expressão.


Na busca pela expressividade física e emocional que Jacque Lecoq nos ensina, faremos as personagens absurdas da Saga de Ágatha serem inspiradas nos tipos comuns do carnaval paulistano, como a foliã apaixonada, a rainha do bloco, o mestre-sala, a porta-bandeira, o malandro, a velha guarda. Sabemos da força imagética dessas figuras e de como elas podem contribuir na narrativa da Saga. 


Se “o fervo é luta”, o carnaval é resistência. E para ocupar uma praça na criação de uma linguagem, é preciso ter a consciência de que a cena é de todo mundo. O espaço da criação será a Praça Elis Regina como um todo. Itinerante. Caminhante. Errantes. A Saga de Ágatha convida o público a reconhecer a Praça Elis Regina com os olhos do teatro.

O envolvimento da vizinhança com a linguagem do teatro da Cia. Vai Dá Boa é fundamental no surgimento de nosso espetáculo. 


O território passa a ser fundante em nosso modo de fazer teatro. Não estamos ocupando um Teatro físico para denunciar o absurdo do poder. Estamos fazendo linguagem na rua para teatralizar o horror que o poder se tornou em tempos de bilionários. É preciso fazer na rua, pois nossa urgência é pública! Um teatro expansivo. Uma linguagem carnavalesca que se escancara para escancarar o absurdo. O escracho e o humor na ponta da língua de uma dramaturgia ácida e sarcástica.

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